O
município de Anajatuba, historicamente, é palco de disputas políticas entre
dois grupos antagônicos, cujos interesses individuais muitas vezes prejudicam o
b em estar da comunidade. Essa situação acontecia mesmo antes de sua
emancipação política ocorrida em 1854.
Joaquim
José da Silva Rosa Filho, o Comendador Rosa, tido como o fundador da Vila de
Santa Maria de Anajatuba, disputava o poder com Sylvestre Pereira da Silva
Coqueiro, ambos eleitos para a Primeira Câmara Municipal nas eleições
municipais de 1855.
O
Comendador Rosa, comandante do 2º Batalhão da 2ª Legião da Guarda Nacional no
termo do Mearim, por isso conhecido como Capitão Mor, era amigo do também
Comendador Padre Inácio Mendes do Moraes e Silva, proprietário da Fazenda Buenos Aires, na
região do Teso, em Anajatuba. Ambos foram eleitores especiais da antiga Vila do
Mearim, hoje Vitória do Mearim.
A
Guerra da Balaiada vinha sendo gestada em vários pontos do Maranhão, devido a
insatisfações de minorias diante dos procedimentos políticos e administrativos do poder
dominante e explodiu na Vila da Manga, espalhando-se rapidamente, haja vista as
várias lideranças isoladas, em várias frentes.
Os
rebanhos bovinos dos campos de Anajatuba, até hoje, são remanejados para outros
locais, em busca de pasto, na época do verão. O Padre Inácio Mendes de Moraes e
Silva, a quem é atribuída velada orientação do levante nesta região, mandou uma
boiada para Manga do Iguará, saída de sua fazenda nos campos de Anajatuba,
conduzida por alguns vaqueiros chefiados por Raimundo Gomes Vieira Jutai. Esse piauiense tinha essa alcunha
porque morava na ilha Jutai, próxima de Buenos Aires.
Por
alguma razão, talvez por excessos decorrentes de bebidas, o delegado da região
mandou prender alguns vaqueiros, causando sérios problemas na locomoção do
gado, sendo alguns magotes conduzidos de volta.
O
subchefe do lugar era José do Egito Pereira da Silva Coqueiro, provavelmente o
pai do adversário político do Comendador Rosa, ao qual pertencia o Padre
Inácio, razão por que não foram atendidos os pedidos de Raimundo Gomes para que
os vaqueiros fossem libertados a fim de continuarem a viagem.
Raimundo
Gomes retornou a Buenos Aires a fim de comunicar o ocorrido ao seu patrão, o
qual, percebendo que se tratava de retaliação política (pois sua irmã
Guilhermina Julieta de Moraes e Silva era casada com um dos parentes do
subchefe Silvino Pereira da Silva Coqueiro), recomendou que tentasse novamente
a libertação com o argumento de o gado pertencer a um cunhado de seu parente.
Acrescentou, entretanto, que se não obtivesse a libertação dos homens, os
arrancasse à força da prisão. Como
Raimundo Gomes não obteve êxito nessa
tentativa, comandou a invasão da cadeia, que resultou na explosão da Guerra da
Balaiada.
A
velada orientação dos dois Comendadores nas ações da Balaiada, depreende-se do
fato dos rebelados jamais terem assaltado fazendas nos campos que hoje
constituem os municípios de Anajatuba, Arari e Vitória do Mearim. Alguns
relatos de moradores antigos nos falam da acolhida de muitos balaios
perseguidos em fazendas pertencentes aos dois comendadores. Também a condição
de letramento de Raimundo Gomes não lhe permitia escrever o documento de caráter político
apresentado quando da invasão da cadeia, o que leva os estudiosos do assunto a
atribuir a sua autoria ao Padre Inácio.
O
Padre Clodomir Brandt e Silva, em seu livro Assuntos
Ararienses, nos informa que Raimundo Gomes Vieira Jutai foi posteriormente
ordenança de Luiz Alves de Lima e Silva, o futuro Duque de Caxias*.
Os
caminhos da guerra da Balaiada devem, por tudo isso, serem iniciados nas ilhas anajatubenses de Jutai e Buenos
Aires, de onde partiu a boiada do Padre Inácio rumo a Manga do Iguará. Afinal
de contas, a história oficial tem na tendência de estereotipar certos fatos do
passado, mas sua revitalização e releitura estão sendo procuradas através da
ONG Juventude sem Fronteiras e da Agência Intermunicipal de Consórcios da
Região dos Lagos Maranhenses – Conlagos.
(Publicado no jornal O ESTADO DO MARANHÃO, de São Luís (Ma), edição de 14 de dezembro de
2007 – Opinião)
( * ) - O Padre Clodomir deve ter se equivocado,
pois segundo MARIA RAIMUNDA ARAUJO em seu livro EM BUSCA DO NEGRO COSME,
Raimundo Gomes foi deportado e morreu em um navio).
Texto extraído do livro inédito “As Crônicas de Anajatuba”